segunda-feira, 18 de novembro de 2024

                                   O Equívoco de Jeremias


No ano de 1961, quando o Livro dos Médiuns completava o seu primeiro centenário de lançamento, nascia Jeremias em pacata cidade do interior do Brasil. 

 

Ao completar a segunda década de vida, começou a perceber estranhos sinais em seu corpo e com suas percepções. Ouvia vozes mesmo estando sozinho, além de visões um pouco embaçadas de pessoas que haviam morrido, mas sobretudo, apresentava uma incontida vontade de escrever, que mais tarde se revelaria na psicografia de receituários. 

 

Dona Zefa, sua madrinha, que se tornara espírita ainda criança, aconselhou-o a estudar e conhecer o Espiritismo. Ela dizia que a mediunidade começante, tal qual pedra preciosa que, encontrada no charco, necessitava ser burilada para remover todas as imperfeições e somente após, poderia ser melhor admirada, manifestando todas as suas qualidades. 

 

O jovem então, pôs-se a estudar sobre o inusitado assunto.

 

Seguindo as orientações de sua madrinha, começou a frequentar, em sua cidade, o Centro Espírita “do seu Jair” como era carinhosamente conhecido o Centro Espírita da Esperança.  Muito entusiasmado, agarrou todas as oportunidades de trabalho e o fenômeno mediúnico que começa hesitante, se fazia agora, mais intenso.

 

Sim, Jeremias possuía mediunidade psicográfica em que bondosos espíritos utilizavam-se para fornecer orientações e prescrever alguns tratamentos naturais para irmãos encarnados, que o procuravam dia e noite.

 

Com o tempo, Jeremias passou a ser conhecedor dos postulados espíritas e assumiu maiores responsabilidades no centro espírita formando grupos de estudos e participando ativamente das reuniões mediúnicas, nas quais, sempre era o maior destaque pelos seus conhecimentos, suas capacidades e pelo fenômeno que protagonizava.

 

Importa dizer que o número de frequentadores do Centro “do seu Jair” multiplicou-se. Irmãos de toda a região compareciam às sessões, sempre em busca dos préstimos mediúnicos do irmão Jeremias.

 

As crescentes responsabilidades, dentro e fora da casa espírita, requeriam dedicação cada vez maior. De família formada, esposa e um casal de filhos, Jeremias, com determinação e firmeza também se consagrava aos compromissos profissionais, como contador em um escritório da cidade. 

 

Após duas décadas de contínuos trabalhos, estranha modificação foi observada no médium receitista, o qual sob o efeito da enfadonha rotina dos trabalhos mediúnicos, foram aos poucos, desestimulando-o.

 

Mesmo recebendo apoio dos integrantes do centro espírita, bem como da equipe espiritual, que perseverava no simples cumprimento do planejamento, Jeremias demostrava visível cansaço, brotando em seu íntimo, a dúvida sobre manter ou não com as responsabilidades e compromissos espirituais.

 

Com o crescimento dos filhos e o aumento das despesas familiares, Jeremias sempre atarefado, procurou por outras fontes de renda que o auxiliassem a cobrir as despesas.

 

Com este propósito, realizou uma pesquisa na internet onde deparou-se com algumas famosas personalidades espíritas que ministravam cursos espíritas online, assim como, vez ou outra, compareciam em eventos espíritas. O que chamou atenção de Jeremias causando-lhe até certa estranheza, foi que em ambas as atividades os participantes deveriam pagar uma taxa.

 

Consultado o seu Jair e Dona Zefa, que ele os tinha por seguros orientadores, foi aconselhado para não realizar a cobrança sobre as atividades espíritas.  Nessa altura foi lembrado a ele o ensinamento evangélico de Jesus que preconizava “dai de graça o que de graça recebia”.

 

Entretanto, Jeremias, contrário a estas sábias orientações, alegava que passara longo tempo de sua vida, inclusive virando muitas noites, estudando a doutrina espírita e era justo que agora, de certa forma, pudesse auferir algum retorno.

 

Esquecido de que o dom espiritual, da qual era portador, fora um dom outorgado por Deus, ele atribuía sua mediunidade ao seu único e exclusivo esforço.  Pensava, equivocado, tal qual a profissão de contador que exercia, poderia empregar a mediunidade também em benefício próprio, após anos em que a utilizara beneficiando outros irmãos.

 

Sem êxito de demovê-lo desta perigosa ideia, os companheiros encarnados e desencarnados deixaram-no agir pelo seu próprio arbítrio. Jeremias então planejou alguns cursos para serem administrados no formato online, obtendo sucesso pela adesão de vários frequentadores, que depositavam para o médium determinado valor a cada “aula” ministrada.

 

Após algum tempo, decidiu também cobrar, daqueles que podiam pagar, as receitas que eram enviadas do plano espiritual, durante as reuniões no centro espírita. Seu Jair, tentou demovê-lo desta infeliz iniciativa, porém sem êxito, e com indisfarçável decepção, convidou o companheiro equivocado a não mais frequentar as reuniões mediúnicas, continuando somente com a reunião de estudo. De forma irresponsável e sem medir consequências, Jeremias passou a realizar as reuniões mediúnicas em sua própria residência.

 

Os amigos espirituais que, junto ao médium, realizavam um profícuo trabalho na caridade, aos poucos, foram abandonando seus postos de trabalho, não sem antes, por derradeira tentativa, chamá-lo para o caminho reto dos compromissos anteriormente assumidos. Tudo em vão.

 

Na mediunidade em geral, principalmente se médium e espírito assumem trabalho de parceria, quando o espaço que era ocupado pela espiritualidade superior torna-se vago, rapidamente os espíritos inferiores, interessados na desdita e na ridicularização do médium, bem como, em obstar o desenvolvimento da doutrina espírita na Terra, passam a ocupar o comando do médium.

 

Assim, sem perceber, Jeremias passou a ser orientado pelos espíritos das trevas, perdendo enorme oportunidade de concluir a sua encarnação como um médium de compromissos e deveres bem concluídos, que é fonte de eterna alegria.

 

Desnecessário dizer que, aos poucos, a frequência de Jeremias à casa espírita foi diminuindo até não mais comparecer e logo, devido a atropelos ocorridos no lar, os trabalhos do receituário e das orientações mediúnicas aos enfermos e necessitados, assim como os cursos taxados, encerraram-se de forma melancólica, deixando à consciência de nosso irmão Jeremias a pensar:

 

“Dai de graça o que de graça recebeste”...  

 Ele não nos ensinaria nada em vão. 

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