O Equívoco de Jeremias
No ano de 1961, quando o
Livro dos Médiuns completava o seu primeiro centenário de lançamento, nascia
Jeremias em pacata cidade do interior do Brasil.
Ao completar a segunda
década de vida, começou a perceber estranhos sinais em seu corpo e com suas
percepções. Ouvia vozes mesmo estando sozinho, além de visões um pouco embaçadas
de pessoas que haviam morrido, mas sobretudo, apresentava uma incontida vontade
de escrever, que mais tarde se revelaria na psicografia de receituários.
Dona Zefa, sua madrinha, que
se tornara espírita ainda criança, aconselhou-o a estudar e conhecer o
Espiritismo. Ela dizia que a mediunidade começante, tal qual pedra preciosa que,
encontrada no charco, necessitava ser burilada para remover todas as imperfeições
e somente após, poderia ser melhor admirada, manifestando todas as suas
qualidades.
O jovem então, pôs-se a
estudar sobre o inusitado assunto.
Seguindo as orientações de
sua madrinha, começou a frequentar, em sua cidade, o Centro Espírita “do seu
Jair” como era carinhosamente conhecido o Centro Espírita da Esperança. Muito
entusiasmado, agarrou todas as oportunidades de trabalho e o fenômeno mediúnico
que começa hesitante, se fazia agora, mais intenso.
Sim, Jeremias possuía
mediunidade psicográfica em que bondosos espíritos utilizavam-se para fornecer
orientações e prescrever alguns tratamentos naturais para irmãos encarnados,
que o procuravam dia e noite.
Com o tempo, Jeremias passou
a ser conhecedor dos postulados espíritas e assumiu maiores responsabilidades
no centro espírita formando grupos de estudos e participando ativamente das
reuniões mediúnicas, nas quais, sempre era o maior destaque pelos seus
conhecimentos, suas capacidades e pelo fenômeno que protagonizava.
Importa dizer que o número
de frequentadores do Centro “do seu Jair” multiplicou-se. Irmãos de toda a região
compareciam às sessões, sempre em busca dos préstimos mediúnicos do irmão
Jeremias.
As crescentes responsabilidades,
dentro e fora da casa espírita, requeriam dedicação cada vez maior. De família
formada, esposa e um casal de filhos, Jeremias, com determinação e firmeza
também se consagrava aos compromissos profissionais, como contador em um
escritório da cidade.
Após duas décadas de
contínuos trabalhos, estranha modificação foi observada no médium receitista, o
qual sob o efeito da enfadonha rotina dos trabalhos mediúnicos, foram aos
poucos, desestimulando-o.
Mesmo recebendo apoio dos
integrantes do centro espírita, bem como da equipe espiritual, que perseverava no
simples cumprimento do planejamento, Jeremias demostrava visível cansaço,
brotando em seu íntimo, a dúvida sobre manter ou não com as responsabilidades e
compromissos espirituais.
Com o crescimento dos filhos
e o aumento das despesas familiares, Jeremias sempre atarefado, procurou por
outras fontes de renda que o auxiliassem a cobrir as despesas.
Com este propósito, realizou
uma pesquisa na internet onde deparou-se com algumas famosas personalidades
espíritas que ministravam cursos espíritas online, assim como, vez ou outra,
compareciam em eventos espíritas. O que chamou atenção de Jeremias causando-lhe
até certa estranheza, foi que em ambas as atividades os participantes deveriam
pagar uma taxa.
Consultado o seu Jair e Dona
Zefa, que ele os tinha por seguros orientadores, foi aconselhado para não
realizar a cobrança sobre as atividades espíritas. Nessa altura foi lembrado
a ele o ensinamento evangélico de Jesus que preconizava “dai de graça o que de
graça recebia”.
Entretanto, Jeremias,
contrário a estas sábias orientações, alegava que passara longo tempo de sua
vida, inclusive virando muitas noites, estudando a doutrina espírita e era
justo que agora, de certa forma, pudesse auferir algum retorno.
Esquecido de que o dom
espiritual, da qual era portador, fora um dom outorgado por Deus, ele atribuía sua
mediunidade ao seu único e exclusivo esforço. Pensava, equivocado, tal
qual a profissão de contador que exercia, poderia empregar a mediunidade também
em benefício próprio, após anos em que a utilizara beneficiando outros irmãos.
Sem êxito de demovê-lo desta
perigosa ideia, os companheiros encarnados e desencarnados deixaram-no agir pelo
seu próprio arbítrio. Jeremias então planejou alguns cursos para serem
administrados no formato online, obtendo sucesso pela adesão de vários
frequentadores, que depositavam para o médium determinado valor a cada “aula”
ministrada.
Após algum tempo, decidiu
também cobrar, daqueles que podiam pagar, as receitas que eram enviadas do
plano espiritual, durante as reuniões no centro espírita. Seu Jair, tentou
demovê-lo desta infeliz iniciativa, porém sem êxito, e com indisfarçável
decepção, convidou o companheiro equivocado a não mais frequentar as reuniões
mediúnicas, continuando somente com a reunião de estudo. De forma irresponsável
e sem medir consequências, Jeremias passou a realizar as reuniões mediúnicas em
sua própria residência.
Os amigos espirituais que,
junto ao médium, realizavam um profícuo trabalho na caridade, aos poucos, foram
abandonando seus postos de trabalho, não sem antes, por derradeira tentativa,
chamá-lo para o caminho reto dos compromissos anteriormente assumidos. Tudo em
vão.
Na mediunidade em geral, principalmente
se médium e espírito assumem trabalho de parceria, quando o espaço que era
ocupado pela espiritualidade superior torna-se vago, rapidamente os espíritos
inferiores, interessados na desdita e na ridicularização do médium, bem como,
em obstar o desenvolvimento da doutrina espírita na Terra, passam a ocupar o
comando do médium.
Assim, sem perceber,
Jeremias passou a ser orientado pelos espíritos das trevas, perdendo enorme
oportunidade de concluir a sua encarnação como um médium de compromissos e deveres
bem concluídos, que é fonte de eterna alegria.
Desnecessário dizer que, aos
poucos, a frequência de Jeremias à casa espírita foi diminuindo até não mais
comparecer e logo, devido a atropelos ocorridos no lar, os trabalhos do receituário
e das orientações mediúnicas aos enfermos e necessitados, assim como os cursos taxados,
encerraram-se de forma melancólica, deixando à consciência de nosso irmão
Jeremias a pensar:
“Dai de graça o que de graça recebeste”...