Judas – lições de um
espírito redimido
As conquistas do mundo
são cheias de ciladas para o espírito e, entre elas, é
possível que nos transformemos em órgão de escândalo para a verdade que o Mestre representa.
Judas
– Boa Nova
Profundas e expressivas lições
encontramos ao refletirmos sobre os acontecimentos que conduziram Jesus à
prisão e, posteriormente ao martírio, estudando, sob a ótica espírita, a
participação ativa de Judas.
Em pelo menos três obras de
Humberto de Campos, (Irmão X), e Emmanuel, ambos pela psicografia de Chico Xavier,
nos deparamos com informações que somente a espiritualidade superior poderia
fornecer, em busca de melhor compreensão deste drama que envolveu o irmão
equivocado.
No livro Palavras do Infinito, há expressiva página, que relata o encontro,
no mundo espiritual, no século vinte, entre Judas Iscariotes e
Humberto de Campos. Com o espírito curioso de repórter, nosso irmão dirige
algumas questões a Judas, que humildemente se propõe responder:
- “É
uma verdade tudo quanto reza o Novo Testamento com respeito à sua personalidade
na tragédia da condenação de Jesus”?
-
“Em parte... Os escribas que redigiram os evangelhos não atenderam às
circunstâncias e às tricas políticas que acima dos meus atos predominaram na
nefanda crucificação. Pôncio Pilatos e o tetrarca da Galiléia, além dos seus
interesses individuais na questão, tinham ainda a seu cargo salvaguardar os
interesses do Estado romano, empenhado em satisfazer as aspirações religiosas
dos anciãos judeus”.
Refletindo nesta
passagem, observa-se que desde os tempos longínquos, as origens do mal
repetem-se agindo desde a intimidade da dureza do coração humano. Os religiosos
da época, representados pela ortodoxia judia, desejavam de maneira exclusiva, o
reino do céu a ferro e fogo; enquanto, por outro lado, Roma aspirava pelo reino
da Terra. Colocando-se entre estas duas forças antagônicas, temos Jesus, com
sua pureza impensável a nós, representando o caminho a que se deve seguir para
o intento do discípulo que deseja “subir
aos céus”.
Neste texto, Judas
considerava a si próprio como:
“um
dos apaixonados pelas ideias socialistas do Mestre, porém o meu excessivo zelo
pela doutrina me fez sacrificar o seu fundador. Acima dos corações, eu via a
política, única arma com a qual poderia triunfar e Jesus não obteria nenhuma
vitória”.
Recorremos
também à obra Lázaro Redivivo, pelo
lápis abençoado de Chico Xavier, ditado pelo mesmo Irmão X, o qual afirma a
respeito de Judas, em auxílio ao nosso entendimento:
“Judas,
amava o Mestre, entretanto, competia-lhe cuidar dos interesses d’Ele. A vaidade
absorvia-o. A paixão pelas riquezas transitórias empolgava-lhe o espírito.
Despreocupado das necessidades próprias, intentava resolver os problemas do
Senhor, perante as forças políticas do tempo. O Mestre ensinava a
concórdia, a tolerância, a paciência e a esperança, mas, como efetuar as
reformas necessárias, através de simples atitudes idealistas?”
O apóstolo Pedro, traça revelador
perfil sobre Judas, na inolvidável obra Paulo
e Estevão, ditado por Emmanuel a Chico Xavier. Vejamos
suas ponderações:
“Em contato com a
realidade do mundo, cheguei à conclusão de que Judas foi mais infeliz que
perverso. Ele não acreditava na validade das obras sem dinheiro, não
aceitava outro poder que não fosse o dos príncipes do mundo. Estava sempre
inquieto pelo triunfo imediato das ideias do Cristo. Judas, antes do
apostolado, era negociante. Estava habituado a vender a mercadoria e receber o
pagamento imediato. Julgo, nas meditações de agora, que ele não pôde
compreender o Evangelho de outra forma, ignorando que Deus é um credor
cheio de misericórdia, que espera generosamente a todos nós, que não passamos
de míseros devedores. Talvez amasse profundamente o Messias, contudo, a
inquietação fê-lo perder na oportunidade sagrada. Tão só pelo desejo de
apressar a vitória, engendrou a tragédia da cruz, com a sua falta de vigilância”.
Profunda a expressão simbólica
dessa recordação e, com a sua luz, cabe-nos reconhecer que a maioria dos homens
continua a irrefletida ação de Judas, permutando o Mestre, inconscientemente,
por esperanças injustas, por vantagens materiais, por privilégios
passageiros. Judas, sobretudo, desejava encontrar em Jesus as disposições
de um guerreiro do mundo, avassalador, empunhando armas, partindo para cima da
tirania romana e dos adversários da crença. Almejava, como os homens de hoje,
que as autoridades religiosas de Jerusalém pudessem garantir toda a beleza da
boa nova. Que, sob a força da lei, o amor se insinuasse nos corações humanos,
sem suspeitar que ele mesmo, Judas, ainda não havia adquirido tais requisitos.
Enfim, não entendera a profundidade da afirmativa do Cristo: “Meu reino não pertence a este mundo”. Em
nossos dias, infelizmente, da mesma maneira, muitos crentes da fé não a entenderam.
No livro Boa Nova, acima referido, pelas palavras do próprio Judas no
diálogo com o autor espiritual da obra, revela-se suas sinceras intenções:
“Planejei então uma
revolta surda como se projeta hoje em dia na Terra a queda de um chefe de
Estado. O Mestre passaria a um plano secundário e eu
arranjaria colaboradores para uma obra vasta e enérgica...”
Judas, o discípulo invigilante de
outrora, crendo realizar plano que atendesse a seus perturbados interesses,
procurou os sacerdotes no Sinédrio, comprometendo-se em planos que,
dissimulados pelos sacerdotes, queriam enredar Jesus para sua prisão e morte.
Quando percebeu que os fatos
marchavam para outros rumos, Judas, reconhecendo seu erro e percebendo as
promessas não cumpridas daqueles em que havia confiado, roga por compaixão,
recebendo a resposta que ainda ecoa no ouvido de muitos que somente encontram
nos preceitos das religiões tradicionais engodo e falsas verdades que nunca se
realizarão:
- “Que nos importa? Isto é contigo...”
Na sequência, o suicídio de Judas, que foi uma
infeliz tentativa de corrigir um erro com outro erro, lhe custou séculos de
sofrimentos nas zonas inferiores no mundo espiritual, além de imenso remorso
pelas perseguições
infligidas por Roma aos cristãos. Até que, na Europa do século XV, em gloriosa
encarnação, imitando o Mestre, foi traído, vendido e usurpado, terminado suas
provas na fogueira inquisitorial, na personalidade de Joanna D’arc, a donzela
de Domrémy, com intensa e decisiva participação na guerra dos cem anos, libertando
sua pátria, a França, do jugo inglês, além de pacificá-la e uní-la, favorecendo
o caminho para os preparativos, que mais tarde, culminariam na chegada do
Consolador prometido por Jesus sobre a Terra.
Concluo
este artigo, com as declarações finais do diálogo entre Judas e Humberto de
Campos, que nos esclarece que somente à custa da conquista do amor ensinado por
Jesus, libertaremos-nos dos grilhões que nos prendem ao ciclo repetitivo das
encarnações:
“Desde esse dia, em que me entreguei por
amor do Cristo a todos os tormentos e infâmias que me aviltavam, com resignação
e piedade pelos meus verdugos, fechei o ciclo das minhas dolorosas
reencarnações na Terra, sentindo na fronte o ósculo de perdão da minha própria consciência…”
Em tempo. Nos meus
idos períodos de infância e adolescência, era comum no sábado de Aleluia, o
ritual da malhação do Judas, uma tradição católica felizmente quase extinta,
que representa a punição a Judas por trair o Mestre por trinta moedas. Hoje,
porém, por muito menos e às vezes por milhões a mais, traímos a Jesus
descaradamente, enchendo os cofres das instituições religiosas.
Também, quando
alteramos ou deturpamos os textos da Doutrina Espírita, patrocinados por
autoridades que deveriam zelar pela sua integridade, Jesus está sendo traído.
Cada um, porém, receberá segundo as suas obras e nenhuma influência humana será
capaz de impedir a evolução do Espiritismo na Humanidade.
Por vezes chegamos a
achar que, infelizmente, este mundo é uma comédia. Uma comédia triste de se
ver.
Os
grifos são nossos.
Referências
(1) Humberto de Campos. Palavras do
Infinito. Psicografado por Francisco Cândido Xavier. 1ª ed. São
Paulo. Editora LAKE, 1936. 123p.
(2) Irmão X. Lázaro Redivivo. Psicografado
por Francisco Cândido Xavier. 1ª ed. Rio de Janeiro. Editora FEB, 1945. 263p.
(2) Emmanuel. Paulo e Estevão. Psicografado
por Francisco Cândido Xavier. 1ª ed. Rio de Janeiro. Editora FEB, 1941.
600p.
(4) Irmão X. Boa Nova. Psicografado
por Francisco Cândido Xavier. 1ª ed. Rio de Janeiro. Editora FEB, 1941. 208p.